Segundo Gustavo Werneck, presidente da Gerdau, depois de ajustar suas operações, reduzir dívidas e deixar alguns países, a siderúrgica se prepara para um cenário de maior demanda por aço limpo. Quando o público se despediu do Rock in Rio no último domingo (11/09/2022), as 200 toneladas de aço do palco foram desmontadas para serem reaproveitadas como “um automóvel, um prédio”, diz o CEO da Gerdau, Gustavo Werneck. A empresa tem na sucata seu principal fator de competitividade: 73% do aço produzido vem de reciclagem ou reflorestamento, o que garante volume de emissão de CO2 de menos da metade da média da indústria siderúrgica mundial. Depois de ajustar suas operações, reduzir dívidas e deixar alguns países, a empresa se prepara para um cenário de maior demanda por aço limpo. E aposta que a tendência de onshore — ou seja, a busca de fornecedores locais por grandes indústrias para fugir de nós nas cadeias logísticas globais —, já uma realidade nos EUA, chegará também ao Brasil. Como vê o cenário global para ‘commodities’? A guerra na Ucrânia e a crise na China vão afetar preços e demanda? Uma verdade nós temos. O mundo vai ser cada vez mais volátil. Nosso principal pilar estratégico é a capacidade de readaptação. No cenário para o aço, nossa previsão é que os próximos dez anos serão melhores. A China não quer mais ser uma grande exportadora de aço. Há ainda a questão das emissões de CO2, vai mudar o jogo global. Nos últimos sete anos, desalavancamos a empresa e deixamos vários países. Dá uma tranquilidade de que vamos conseguir passar pelo cenário de curto prazo, com a eleição e as questões que o Brasil terá de enfrentar do ponto de vista macroeconômico. E quais são essas questões? Qual é o cenário para o Brasil? O varejo da construção civil está estagnado desde junho de 2021. Ele cresceu muito no pós-pandemia com os incentivos do governo (o Auxílio Emergencial). Em compensação, na infraestrutura, com as parcerias público-privadas, há bastante demanda por aço. Que setores estão mais aquecidos em infraestrutura? O setor de saneamento é crescente, assim como o de energia renovável. Estamos muito alinhados também com o onshore, que é trazer para dentro de casa capacidades de produção que estavam em outros países. Temos visto muito nos EUA. Estamos vendendo bastante aço para empresas que estão construindo plantas de semicondutores e de chips. No Brasil também há esse movimento de ‘onshore’? Aqui no Brasil tivemos muitos investimentos da Suzano, da Klabin e da própria Gerdau. Temos visto essa preocupação com a cadeia (de fornecimento global) no setor automobilístico, de ficar menos dependente de fornecedores externos. Talvez não tão significativo como nos Estados Unidos, mas o segmento automotivo é um bom exemplo do que virá nos próximos anos. Temos sido procurados para entregar soluções que não demandem componentes e peças do exterior. E existe a busca contínua por veículos cada vez mais leves e eficientes (que emitam menos CO2). Somos grandes fornecedores no Brasil e EUA de aços longos, usados na suspensão do veículo e dentro do motor. Essa transformação (para um veículo menos poluente) não passa só pelo motor e bateria, mas pela configuração do carro como um todo. E quanto a Gerdau está investindo nesses projetos? No Brasil, o investimento em aços especiais é de R$ 1 bilhão somando Charqueadas (RS), Pindamonhangaba e Mogi das Cruzes (SP). A matriz energética renovável do Brasil ajuda a atender à demanda por aço mais limpo? Isso é um diferencial. É crescente a solicitação de clientes para saber qual é a nossa emissão de CO2. Querem números auditados e planos concretos. O cliente não aceita se falo que emissões estarão zeradas em 2050, quer saber os próximos dez anos. Se eu não tiver isso, começo a ter dificuldade de atender a brasileiros e clientes globais. A reciclagem entra nessa conta? Reciclagem é o nosso DNA. Da reciclagem de sucata e do reflorestamento de eucalipto, produzimos 73% do aço da Gerdau. O setor no mundo emite em média 1,93 tonelada de CO2 para cada tonelada de aço produzido. A nossa emissão auditada foi de 0,90 tonelada de CO2 no ano passado. Esse é o grande ganho da reciclagem. O Brasil tem uma possibilidade enorme de ser visto como um país que leva a questão de emissão de CO2 na sua indústria muito a sério. A imagem ambiental do Brasil ficou arranhada no governo Bolsonaro. Isso afeta as empresas brasileiras? Está faltando nisso tudo é vender melhor. Todos nós devemos trabalhar em conjunto. Não é questão só do governo. É uma questão do Brasil como um todo. A empresa pretende ampliar o uso de gás nas fábricas? Muito. O gás tem a possibilidade de reduzir a emissão e contribuir para a competitividade. A indústria brasileira, dos muros para dentro, é muito competitiva. Mas a gente perde saindo do portão com logística, portos e tributos. Nossas operações no Brasil e nos EUA são de tamanhos semelhantes. Temos 122 pessoas na Gerdau cuidando de tributos. São sete pessoas nos Estados Unidos e 115 no Brasil. Não tem sentido. O custo Brasil foi quantificado pelo movimento Brasil Competitivo em R$ 1,5 trilhão. É 22% do PIB. É consenso entre economistas que será difícil reduzir a carga tributária diante do aumento dos gastos sociais. A redução de impostos precisa ter clareza de como será a longo prazo. O que nós não defendemos neste momento de forma alguma é que se aumente a carga tributária. Ou seja, piorar aquilo que já é ruim. As reformas, como a trabalhista e a Lei da Terceirização, ajudaram na melhoria de nossa competitividade. Defendemos ter segurança jurídica de que as coisas não vão mudar. A inflação global pressiona a indústria? Como lidar? Criamos alternativas relacionadas à transformação digital. Antes, ao comprar matéria-prima, ficávamos reunidos vendo boletins de preços para tentar entender o momento correto. Hoje tenho plataformas digitais preditivas com inteligência artificial para analisar todas as variáveis no preço de uma matéria-prima. O algoritmo não dá bug quando a Rússia invade a Ucrânia? O algoritmo vai aprendendo. Por exemplo, teve uma tempestade na Austrália e as ferrovias romperam. E eu não consegui antecipar, porque meu algoritmo não pegou isso. Mas hoje ele pega a previsão climática nos países que me afetam. O mundo está cada vez mais volátil. Mas boa parte dos acontecimentos tem precedente e se repete. Consigo ver, por exemplo, determinado conflito que está evoluindo. A dificuldade da transformação digital é colocar recursos em oportunidades de negócio. Caso contrário, você fica usando óculos de realidade virtual para resolver problemas pequenos. A transformação digital é para resolver grandes ineficiências. A empresa tem investido em novas áreas de negócios? A meta é que em dez anos 20% da receita da Gerdau venham de novos negócios: logística, construção e energia. Hoje, nossa empresa de logística, a G2L, é um dos maiores operadores logísticos do Brasil. Logística era um custo e se transformou em receita. A Gerdau quer ser commodity com serviço para melhorar a eficiência dos clientes. O palco do Rock in Rio foi de aço reciclável da Gerdau. Por quê? Vimos ali uma grande oportunidade. Ao fazer o maior palco do festival com aço 100% reciclável, a gente mostra a importância da reciclagem, o fato de o Brasil poder emitir pouco CO2 e que 1 milhão de pessoas hoje vivem em atividades de reciclagem. E no futuro esse aço pode virar um automóvel, um prédio... Fonte: O Globo Seção: Siderurgia & Mineração Publicação: 06/09/2022 (editado) Foto: Reprodução/Twitter/rockinrio
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